A importância do papel do viajante no equilíbrio financeiro, cultural e ambiental dos destinos.
Sustentabilidade é um termo que tem sido um tema quente nos últimos dias, mas que pode ter diferentes significados na sua interpretação. Para mim, era uma questão à qual associava mais a sua vertente ambiental, mas ao longo das minhas viagens rapidamente percebi que a sustentabilidade está presente não só nos aspectos ambientais da natureza, mas também na natureza humana e social.
Viajar é uma das formas mais eficazes de enriquecer os nossos conhecimentos, não há dúvida. Mas como podemos também ampliar a nossa contribuição para o planeta e para as sociedades através das viagens? Desde a medição da nossa pegada de carbono, passando pela ajuda humanitária até à contribuição financeira, o impacto do viajante nos destinos pode – e deve – ser positivo. Em todas as minhas viagens, visitámos culturas vulneráveis em alguns dos cantos mais remotos do planeta. Sinto-me privilegiado por poder proporcionar a outros viajantes a oportunidade de terem um contacto direto com culturas autónomas e paisagens quase imaculadas. Mas até lá, aqui ficam algumas dicas para quem ainda não teve a oportunidade de pôr estas questões em prática!
Apreciação através da privação
Quando somos colocados fora da nossa zona de conforto, aprendemos a valorizar (ainda mais) as coisas que tomamos como garantidas. E não me refiro a um colchão fofinho ou ao acesso a torneiras com água quente corrente – coisas básicas como o acesso a água potável, que nos parece tão óbvio, não existe em todo o lado. Quando a água é destilada, purificada ou simplesmente fervida, torna-se potável – segura para o consumo – mas perde os seus minerais tão importantes para a nossa saúde, e sobretudo para a saúde em movimento, como o sódio (importante na regulação do volume plasmático, na condução dos impulsos nervosos e na contração muscular), o cloreto (importante para o sangue e que impede que este se torne demasiado alcalino) e o potássio (cujas principais funções se reflectem nas actividades neuromusculares). É claro que estamos a falar de pequenas quantidades, mas, a longo prazo, o organismo apercebe-se destas ausências e manifesta as suas carências. Só depois de ter viajado durante muito tempo sem acesso a água mineral é que ganhei um novo respeito pela água que bebo todos os dias. Tenho a sorte de viver em Portugal, um país (ainda) vasto em fontes de água ricas, as melhores do mundo, de fácil acesso e custo reduzido.
Mas e quando chegamos a destinos como a Mongólia, onde grande parte do país é um deserto, a maioria da população tem um estilo de vida nómada, e onde não temos água mineral, nem engarrafada nem na torneira? Também aqui, a maior parte da água potável é obtida a partir de recursos naturais, como nascentes e rios, mas tem sempre de ser purificada, pois contém na sua composição microrganismos com os quais o nosso corpo não está familiarizado. É este tratamento que desmineraliza a água.
No entanto, o racionamento de água também nos dá uma nova visão do seu valor: aprender a gerir o dia a dia com um número limitado de litros de água, em vez de simplesmente abrir uma torneira e usar a quantidade que (pensamos que) precisamos, sem ter a noção de quanta água está realmente a ser gasta. Uma torneira aberta durante apenas 5 minutos gasta, em média, 60 litros de água. Posso dizer-te que, na Mongólia, aprendi a gerir 50 litros de água por dia para quatro pessoas – não só para beber, mas também para cozinhar e fazer a higiene diária básica. Isso faz-te pensar, certo? Claro que aqui a avaliação parece um pouco extrema e até exagerada, porque é uma quantidade muito inferior à que precisávamos… mas a verdade é que já começa a acontecer em algumas cidades, como a Cidade do Cabo, na África do Sul, onde o limite diário já é esses mesmos 50 litros por dia.
Valorização financeira
Nós, que viajamos, somos privilegiados. Uma das muitas perguntas que me fazem quando viajo, nos destinos, é “porque é que viajo?”. O que é que eu faço lá, porquê? Em muitos lugares do mundo, não se viaja por prazer, apenas por necessidade. Tal como os refugiados, os grandes êxodos resultam de conflitos políticos ou ambientais. Viaja por falta de recursos locais, para trabalhar. Mas poucos são os que viajam por prazer. Que sorte a nossa?
Por isso, quando viajo, porquê investir financeiramente nas grandes cadeias internacionais, quando podemos ajudar a sustentar a economia local? Porquê ir ao McDonalds em Pequim, quando posso comer no mercado local? Porquê dormir no Hilton, quando podemos ficar num bom hotel local, com condições semelhantes mas que transborda cultura, e investimos nessa economia?
É provável que esta seja uma das soluções mais sustentáveis e com maior impacto no menor período de tempo. Muitas vezes, é a minha decisão de ficar com os habitantes locais que me ajuda a aprender e a compreender melhor o destino, bem como a sua estrutura social de famílias e empresas locais.
Apreciação cultural
Em muitas das minhas viagens, fiz (e faço) voluntariado e outras experiências culturais, como participar em festivais e/ou celebrações locais, e tento proporcionar essa experiência também aos que viajam comigo. Em vez de participarmos em expedições específicas, mergulhámos em celebrações locais com famílias locais. Ganhamos todo um novo respeito por quem nos recebe, compreendemos a cultura, promovemos a nossa dedicação e ainda somos retribuídos com a gratidão de quem nos recebe, pelo interesse demonstrado pela genuinidade da nossa visita.
Na Mongólia, participamos em algumas destas celebrações, sem nunca compreendermos nada da sua língua e sem que eles compreendam nada da nossa. Mas há aqui qualquer coisa de mágico, uma linguagem universal que começa com um sorriso e se desdobra no verdadeiro espírito humano – há coisas que não precisam de tradução. Uma hora desta troca de experiências vale mais do que muitos livros lidos numa biblioteca. E, por vezes, esta compreensão de uma nova cultura também nos ajuda a sermos melhores na nossa essência.
Implica também respeitar e adotar os costumes locais. O exemplo mais óbvio parece-me ser a forma como nos apresentamos, ou como nos vestimos. Em muitas culturas, os nossos micro-shorts não são bem vistos. Nos templos, normalmente não é permitido mostrar nada acima do joelho, nem os ombros, por vezes é necessário cobrir a cabeça. É uma questão sustentável? Sim. A sustentabilidade também tem a ver com respeito – quando desrespeitamos uma cultura, desrespeitamos a sua essência, e sem essência deixa de haver o privilégio do conhecimento.
Pegada de carbono do viajante
Trata-se de um fator global, não local. Os nossos pequenos gestos que se reflectem em grande escala, contributos que à partida são insignificantes, mas que quando adoptados em massa se traduzem num enorme alento para o planeta.
Este é também um dos factores que nos leva a optar por transportes públicos locais em vez de transportes privados. Incentivamos a opção de escolher marcas que também tenham uma pegada ecológica reduzida, que não façam testes em animais, que utilizem materiais recicláveis. Incentivamos a utilização de cantis em vez de garrafas de plástico, produtos de higiene sem químicos e que não sejam prejudiciais para o ambiente.
Especialmente quando viajamos para destinos sem grandes redes de canalização, onde sei que, se optar por usar champôs e cremes sem químicos, as águas sujas dos meus banhos, que podem correr diretamente para os rios e lagos locais, não serão (tão) prejudiciais para a vida local – refiro-me a bactérias e peixes, insectos e pássaros, à fauna e flora em geral.
Grandes atitudes exigem pequenas decisões. E uma a uma, conseguimos fazer deste um planeta melhor, para que possamos percorrê-lo por muitos e bons anos.
Espero que este pequeno texto te inspire a ser um viajante mais consciente, e que te dê a oportunidade de vires conhecer alguns dos destinos mais remotos do planeta comigo!